quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

A perda da conectividade



Bruno estava sentado no sofá da sala lendo o caderno de esportes do jornal quando Daniela, sua esposa chegou do shopping cheia de sacolas.

- Oi amor! – e lhe deu um beijo. Onde estão os meninos? Perguntou andando em direção à árvore de Natal.
- Estão lá dentro. O Pietro esta jogando play station e o Arthur está no computador.
- Essa casa tá um silêncio....
- Comprou todos os presentes de Natal? – Perguntou Bruno sem tirar os olhos do jornal.
- A Fnac e a Apple levaram todo o nosso dinheiro – e sentou-se ao lado de Bruno, puxando o seu jornal.
- Dani, me devolve o jornal.
- Amor, vai dando um tchau para este papel sujo – e lhe deu outro beijo. Já que você não decide o que quer de Natal, eu decidi por você. Não vai mais sujar as mãos.
- Mas, eu gosto de sujar as mãos. E quem disse que eu não sei o que eu quero de Natal? – e puxou o jornal de volta.
- E o Bonitão decide depois que eu volto do shopping? Outra saga igual a de hoje, não vai rolar. Posso comprar pela internet? As pessoas se estapeavam pelo iPhone 5 e pelos novos joguinhos dos meninos. Mãe sofre!  - e ligou a televisão.

Bruno muito calmamente se levanta, desliga a televisão e chama os meninos – que levam mais de cinco minutos para aparecerem na sala.

- Família, já decidi o que eu quero de Natal. E meu presente começa agora.
- Bruno, não estou entendendo nada.... – disse Daniela.
- Pai, você me faz largar a última etapa do campeonato para essa baboseira? Agora vai querer ler a cartinha para o Papai Noel também? – Diz Pietro revoltado.
- Silêncio todos!! A partir de agora e por sete dias, todos nós, eu disse todos, ficaremos sem telas. Sem computador, telefone, internet, televisão, iPad, vídeo game e qualquer visor ou pontocom da vida quando pisarmos nessa casa e no final de semana...
- Mãe, o Papai esta usando drogas? – Perguntou Arthur.
- Arthur, vem cá com o Papai... – E puxou o menino. Estamos cada dia mais conectados nessas telas malditas e menos conectados com nós mesmos. Somos uma família e não fazemos nada juntos, ou se fazemos nunca estamos só nós.. Somos nós, com 25 curtis, 5 fotos publicadas, 5 sons de jogos e apitos e mais não sei quantos bate-papos com amiguinhos. – e deu uma pausa. Dani, não quero iPad nenhum de Natal, adoro o cheio do jornal, o barulho da dobra da folha, do sabonete que limpa o carbono. Não quero mudar isso...
- Ah Pai fala sério! Crise da meia idade sete anos antes? Vai fazer terapia e me deixa com meus eletrônicos.

Daniela assustada com a reação dos filhos percebeu que Bruno tinha razão e o apoiou na proposta, ou melhor, em seu presente de Natal– por mais inusitado e radical que fosse.
Pietro esperneou, gritou, se revoltou e se trancou no quarto se negando a entregar sua conectividade toda. Arthur em parceria com o irmão mais velho, se jogou no chão e fez biquinho. Mas, depois de muito drama, os itens foram confiscados e os ânimos acalmados.

- E o que fazemos agora Sr. Presente de Natal ? – Perguntou Pietro.
- Vamos jantar conversando um com os outros, falar do dia, da escola, do futebol e de nossas próximas férias – Sr. Adolescente rebelde – e deu um beijo em seu filho.

O ambiente parecia estranho, a conversa estava meio truncada, pouco natural – talvez o silencio e a falta de interrupções constantes criavam um novo espaço que hoje ficou desconfortável, incomum. Agora falamos tanto por mensagens de textos e e-mails que quando encontramos as pessoas, ou quando o telefone toca para um bate-papo, achamos esquisito, ficamos com preguiça, queremos cortar logo. Vai entender essa proximidade cada vez mais distante e oca.

Bruno ficou animado com essa estranheza diferente e já começou a reparar melhor em seus filhos, em sua esposa e na vida deles. Abriu uma garrafa de vinho, ficou sabendo da peça de teatro do Arthur e que Pietro estava apaixonado por uma colega de turma. Aos poucos a estranheza foi se dissipando e dando espaço a um lugar comum – espaço este perdido ou ocupado sabe-se lá quando.

- Pai, o que vamos fazer agora que acabou o jantar até a hora de dormir? – perguntou Arthur.
- Vocês já fizeram a lição?
- Já... – respondeu Pietro. Isso aqui esta parecendo quando falta luz e a gente não sabe o que dá para fazer, que sensação esquisita! – todos riram.

Bruno levantou da mesa e foi buscar seu teclado que estava guardado há anos. E mesmo enferrujado, começou a relembrar a época que fazia parte de uma banda na faculdade. Os meninos adoram, Pietro pediu logo uma guitarra para o Pai e Arthur uma bateria. Mesmo que fosse a vibe do momento, a noite de conversa e cantoria estava muito agradável.

Bruno deu para cada filho um livro para lerem antes de dormir e fez amor com Daniela como há muito tempo não faziam.

Nos dias posteriores, jogaram jogos de tabuleiro, brincaram na rua, jogaram bola, andaram de bicicleta, fizeram trilhas até chegarem a cachoeiras, foram à praia, usaram a varanda da casa para olharem a lua e as estrelas, andaram de skate, cozinharam juntos, conversaram, conversaram, tocaram mais música, fizeram mais sexo (Bruno e Daniela – é claro!) e ficaram mais próximos como nunca.

Perceberam o que mudou enquanto ficaram in off entre si. Se preencheram um com os outros de verdade e não através de vidas paralelas cibernéticas irreais.

Bruno teve a certeza que esta percepção toda se deu por conta de sua radicalidade contra as telas e conectividades alheias. Por conta da dor saudável da abstinência.

No início foi estranho, difícil, muitas reclamações, logisticamente complicado. Afinal se comunicar de verdade e conviver, nunca é fácil. Mas, ao final do sétimo dia, Bruno reuniu a família na sala e perguntou a cada um o que haviam aprendido e sentido durante esses dias.

Pietro foi logo o primeiro a responder:

- Achei que você estava entrando em crise da meia idade antecipada, que era tudo uma palhaçada e que seu pedido de réveillon seria se mudar para Mauá e abrir uma pousada para conversar com os pássaros. Mas, depois comecei a gostar. Quero aprender a tocar guitarra. Percebi que posso me divertir com a gente, em família, mas principalmente que apesar do touch screen ser mais fácil, rápido e prático, gosto do cheiro das coisas, de levar um livro em baixo do braço, de suar, de estar vivendo a parada despreocupado se vão te mandar mensagens ou de ter que postar fotos para outros curtirem.... Achei maneira essa experiência, Pai! Mas, devolve meu iPad, meu celular, meu vídeo game, meu notebook, meus jogos e liga minha televisão, pelo amor de Deus!!??

- Sei lá Pai – disse Arthur. Achei estranho não usar telefone, computador, não ver TV, acho que ler livro é a mesma coisa que ver TV, só que de forma diferente. Jogando Wii eu suo igual. Mas, gostei muito das outras coisas que fizemos... me amarrei nas novas manobras do skate e de ficar mais fora de casa com vocês e conhecer gente nova...

- Amor, acho que devemos fazer essa experiência de desintoxicação, no mínimo uma vez por ano. Achei muito bom para a nossa família e para nós dois.... – e lhe deu um beijo. – E para você como foi?

Bruno deu uma pausa...

- Experiências como esta não tem respostas certas ou erradas, são experiências, cada um terá a sua e sempre que repetida – será diferente. O importante foi o que descobrimos e o que vamos fazer com o que descobrimos. Temos que aprender a priorizar as coisas, nos priorizar como família, não podemos nos tornar invisíveis presentes uns com os outros, pois perderemos o melhor de nós.... Podemos ter tudo, fazer tudo... só equilibrarmos. Mas, às vezes as coisas perdem o controle, que só tirando tudo que somos capazes de enxergar e valorizar algo simples, do cotidiano....

- Ihhh Papai virou poeta ou profeta agora... – interrompeu Pietro ironicamente.





terça-feira, 4 de dezembro de 2012

A musicalidade da vida....


Estava assistindo ao DVD do show da Ivete, Caetano e Gil - um que foi ao ar pela Rede Globo. Não tive a oportunidade de assisti-lo antes. O que mais me tocou foi ver músicos fantásticos cantarem com a pureza da alma, de forma tão verdadeira, entregue e sincera - e como a música conecta as pessoas, toca, emociona.

Mais do que isso, o que existe por trás das letras das músicas? Além de um Q de pecado, zum de besouro, tem histórias rasgadas, comuns, minhas suas, nossas. Histórias que marcaram - que nos faz lembrar pessoas, cheiros, momentos e muita coisa que ninguém pode arrancar de nós, pois são nossas, só nossas - dividas por caixinhas diria.

A vida nos dá o sabor de viver, o amargo é a gente que coloca, ok ela e as pessoas também azedam muita coisa, principalmente os sonhos. Mas, a música trás a melodia, a leveza que precisamos para colocar as pedras do caminho em outro lugar. Para a gente fugir e viajar, aonde quer que vá, aonde quer que vá.

A música que toca a alma, que liberta a alma.

Por que anda faltando tanta alma no mundo? Tanta musica? Drão, o amor da gente é como um grão, dura caminhada pela noite escura. Mas, apesar da caminhada pela noite escura, há tanta luz e poesia orgânica nessa natureza morta – não é? Onde nos perdemos? Onde nos esquecemos? Onde te esqueci?

É meio abstrato tudo isso, falar de arte de emoção é quase que intangível, assim como nós seres estranhos, incompreendidos e incompreensíveis sempre na busca da busca- até que a morte nos separe. A arte, a emoção toca, emociona ou não diz nada de forma muito particular. E o valor é aquele que a gente dá, inversamente proporcional a todo o mais tangível sofrimento.

Não queria arrumar razão nesse texto, ou em muitas coisas na vida. Tem coisas que simplesmente não tem razão, não tem certo, errado, justificativa ou culpado. Essas coisas existem sem qualquer motivo, ou por todos os motivos do mundo que nos fazem passar por isso ou aquilo.

Já que não há razão, seja irracional sem culpa, ligue o som, acorde a alma e transborde através da melhor melodia que você pode ser hoje, pois amanhã será apenas um flashback.

E para finalizar, aqui vai a minha música para este texto: