quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Grandparents match


Joana gostava muito de sua avó que andava tristinha depois que José seu avô, fez a passagem há 15 anos. Rodrigo também estava preocupado com seu avô depois que ficou viúvo de sua avó, há 10 anos. Rodrigo e Joana que não se conhecem, viram no metrô o anúncio de um aplicativo de encontros para a terceira idade.

Aplicativo para terceira idade? Nem sei se meu avô tem smartphone, pensou Rodrigo. Pois é, tanto Dona Silvia como seu Pedro tinham smartphones, mas pouco usavam suas principais funções. Porém, moderninhos que são e ativos também, não foi difícil Rodrigo e Joana ensinarem alegremente seus queridos avós usar o grandparents match.

Fotos colocadas com os filhos e netos (é claro!), mescladas com outras em preto e branco, juntamente com as do natal passado – todas fotografadas das fotos impressas guardadas nos álbuns.

Aplicativos ativados e o passa para lá e para cá começou, em um universo limitado de opções -comparado aos demais aplicativos paquera da garotada.

Por coincidência, ou destino, Silvia e Pedro, se gostaram e match!

- Olá, Silvia. Como está a sua tarde?
- Boa tarde, Pedro. Tranquila com minha neta. E a sua?
- Que coincidência, também estou com o meu neto. Ele quem me apresentou este aplicativo.

O início da conversa foi aquele esperado: pedindo desculpas por não saber usar a tecnologia, falando do número de filhos, netos e etc. Passada a primeira etapa de euforia com os netos dando coaching para os avós, o segundo passo, foi pedir para eles se retirassem de perto da cadeira de balanço para que continuassem a sós a comunicação.

- Viúva há quanto tempo?
- 15 anos e você?
- 10 anos... está atualmente em asilo?
- Sim e você?
- Também... mas posso passear... faço minhas atividades ao ar livre.
- Nossa que coincidência, eu também. Na praça da frente, naqueles aparelhos que a prefeitura colocou.
- Eu também faço nesses equipamentos, mas prefiro as aulas da prefeitura na praia, fiz muitos amigos.
- A praia para mim é longe, minha filha não poderia me levar e buscar e os taxistas não são mais tão gentis como antigamente... mas, depois que minha artrose acentuou, preciso me exercitar todos os dias.
- É... sei bem. Tive muitos problemas de saúde, duas pontes, já tirei um rim e curei um câncer de pulmão.
- Nossa! Fico feliz em ver como a medicina evoluiu nos últimos anos. Além desse problema da artrite e fortes dores na coluna, só tenho baixa de potássio e uma leve pressão alta.
- Você está ótima, Silvia. Nas fotos não parece ter nem 75!
- Como você é gentil Pedro, obrigada. Nas fotos seus cabelos são ainda castanhos... – e deu uma risadinha para o celular.
- Castanho 45, dura mais de um mês... – e riu também para o celular – O que costuma fazer?
- Tirando fazer bolos, estar com a família, gosto das palavras cruzadas, as novelas, e é claro que dou meus bordejos por aí. E você?
- Ler o jornal, xadrez com o pessoal daqui, música clássica, escrever poesia na máquina de escrever e uma cervejinha.... Ainda sou do tempo dos bons costumes...

O papo evoluiu com a demora ágil previsível, com o saudosismo da época que eram jovens, o alto preço dos remédios, a época da juventude, de quando não se tinha nenhuma tecnologia, e  quando o primeiro gesto era um beijo na mão.

O papo estava tão bom que as horas passaram, e a bateria caiu, morreu, apagando o grandparents match.

- Minha filha, o celular apagou – disse Silvia se levantando.
- Eu coloco para carregar, vovó...
- Precisa não, minha filha. Tá na hora da minha novela... – e saiu andando para a sala de TV.
- Calma vó... quero saber... marcou de sair com o seu Pedro?
- Sair?
- Vovó, este é um aplicativo de encontros...
- Encontros? Tenho mais idade para isso não, minha filha! – e continuou andando com enorme sorriso no rosto e brilho nos olhos.


Naquele instante, mesmo sem entender nada, Joana compreendeu que sua avó não precisava de um aplicativo de encontros, mas sim, ser ouvida até que seu sorriso aparecesse e seus  olhos brilhassem.